sábado, 1 de fevereiro de 2014

As origens de Resende e de seu fundador Simão da Cunha Gago.

As origens de Resende e de seu fundador Simão da Cunha Gago.
Julio Cesar Fidelis Soares[1]

I-Ascendência de Simão da Cunha Gago
Segundo estudos genealógicos a família Cunha Gago tem ascendência em Henrique da Cunha, amigo do almirante português Martim Affonso de Sousa, que com ele passou a S. Vicente em 1531 com sua mulher Filippa Gago. Ele pertencia à ilustre casa dos Cunhas, os quais procedem pela linha reta masculina de el-rei Dom Fruella II, rei de Leão - Astúrias e Galiza no ano de 923. Sua mulher Fillippa Gago era parenta próxima do 1.º capitão-mor governador-loco tenente do donatário da capitania de S. Vicente - Antonio de Oliveira, cavalheiro fidalgo da casa de el-rei Dom João III.
Nesta linhagem temos Antônio da Cunha Gago, tronco de importante família onde abundam bandeirantes e exploradores dos sertões de Minas Gerais e da descoberta do ouro.
Antonio da Cunha Gago, o Gambeta, era paulista, casou em São Paulo de Piratininga em 1630 com Marta de Miranda, filha de Miguel de Almeida e Miranda, de Cascais, e Maria do Prado. Segundo descritos por Silva Leme tiveram 11 filhos, no volume V de sua «Genealogia Paulistana», entre os quais destacamos Simão da Cunha Gago, casado com Catarina Portes del Rei (?-1687 morta em Taubaté, testada), irmã de Ana Portes, sua cunhada. Tiveram quatro filhos, entre eles eles João Portes del Rei, o qual casou em 1687 com Isabel da Fonseca (?-1708, morta em Mogi das Cruzes, já então casada pela segunda vez com Antonio de Pontes Sutil, da família dos Godois). Tiveram cinco filhos. Em outro registro temos o seguinte : Sargento-mor Simão da Cunha Gago casado em Mogi das Cruzes em 1713 com Anna Pimenta de Abreu, irmã de Julianna Pimenta filha  de Antonio Pimenta de Abreu e de Angela Paes , casada com Manoel da Cunha Gago, que faleceu em 1752 em Mogi das Cruzes era tio de Simão da Cunha Gago em razão do primeiro casamento  de seu avô Henrique da Cunha Gago (o velho) nascido perto de Santos em 1560, foi morador em São Paulo de Piratininga onde faleceu em 1624, tendo sido casado 3 vezes: a primeira com Izabel Fernandes falecida em 1599, filha do capitão Salvador Pires e de sua segunda mulher Mecia Fernandes (Mecia-ussú)[2]; pela segunda vez foi casado com Catharina de Unhatte, filha de Luiz de Unhatte e de Maria Antunes, parente de Diogo de Unhatte, escrivão da ouvidoria e fazenda da capitania de S. Vicente e fundador de Paranaguá; casou-se pela terceira vez com Maria de Piña, viúva de João de Almeida, filha de Braz de Piña. Sem geração desta terceira mulher.
Assim, a saga dos desbravadores inicia-se, segundo Paranhos a tradição de que na região da Mantiqueira teria passado, em 1596, o bandeirante João Pereira de Souza Botafogo, sem, no entanto, ficar bem estabelecida a sua rota. Outros que se aventuraram, ainda no século XVII, foram Jerônimo da Veiga, em 1643; Sebastião Machado Fernandes Camacho, entre 1645 e 1648, em busca das minas de prata e o próprio Fernão Dias Paes, em 1674. Todos seguiram o Rio Paraíba, atravessaram a Mantiqueira pela garganta do Embaú e se internaram no chamado “caminho geral do sertão”.[3]

Ainda segundo Paranhos, é a partir da Vila de São Francisco das Chagas de Taubaté, que partiram as primeiras bandeiras em direção às chamadas “minas de cataguás”. Passando pela região de Guaipacaré (atual Lorena), transpunham a Mantiqueira e alcançavam o atual território mineiro. Desta forma, exatamente 36 das mais antigas cidades de Minas Gerais foram fundadas por paulistas, entre elas, Baependi, Aiuruoca e Campanha.
Com referência a Aiuruoca temos que em 1694, por carta de Bento Pereira de Sousa Coutinho a D. João de Lencastre, então governador-geral do Brasil, está referenciada uma passagem de paulistas pelo Rio Grande, que tem suas cabeceiras próximas à Serra de Ayuruoca. No Códice Costa Matoso está anotado que Ayuruoca quer dizer “casa de papagaios, aludindo a um penhasco redondo e elevado aos ares sobre um dos mais altos montes daquele lugar, em que os papagaios faziam morada naquele tempo em que os gentios habitavam aqueles lugares”.[4]
O local foi descoberto entre 1705 e 1706, por João de Siqueira Afonso, bandeirante de Taubaté que, segundo informações constantes do mesmo Códice, teria se internado pelo “sertão que então era a parte do sul da estrada que vai para São Paulo, três dias de jornada afastado para aquela parte de São João del-Rei, nas cabeceiras do rio Grande”.[5] Este bandeirante teria achado ouro, anteriormente, em 1704, na região de Guarapiranga (atual Piranga).
De acordo com o que consta da Instituição de Igrejas no Bispado de Mariana, do Cônego Trindade, a freguesia de Ayuruoca foi criada por ato episcopal de 1718, o que, em cotejo com outras informações constantes da Diocese de Campanha, afastam a possibilidade de a freguesia ter sido fundada somente em 1744, por Simão da Cunha Gago, também descobridor de ouro na região.
Ayuruoca era, segundo apontado no Códice, uma famosa freguesia, “com duas capelas suas filiais, assistidas de grande concurso de moradores e assistentes mineiros, com disposições de duráveis minas, por assim o prometerem as constituições de suas continuadas serras e ribeirões com faisqueiras de ouro”.[6]
Simão da Cunha Gago, sargento-mor, nascido em São Paulo de Piratininga[7], casou-se em Mogi das Cruzes com Anna Pimenta de Abreu e foi responsável pela primeira e mais antiga passagem da Mantiqueira para alcançar o Rio Paraíba do Sul, saindo de Ayuruoca e atravessando a atual garganta do Registro, nas Agulhas Negras, passando por terras de Itamonte Minas Gerais.

II-  Do Desbravamento e ocupação da região do Campo Alegre da Paraíba Nova por Simão da Cunha Gago
Nos princípios do século XVII, João Siqueira Afonso, bandeirante de Taubaté, transpôs a Serra da Mantiqueira e ganhou as terras mineiras em busca de ouro.  Em 1702 descobre as Minas do Sumidouro, e continuando sua caminhada descobre as Minas de Guarapiranga em 1704 (cidade de Piranga). Seguindo o Rio Grande vai dar na Serra dos Papagaios (1706) fundando o arraial de Ayuruoca[8] .  Ayuruoca é uma alusão a um penhasco redondo e elevado aos ares, sobre um dos altos montes daquele lugar, em que os papagaios faziam moradas como já havíamos dito. Em 1717 a coroa concede a Dom Brás Baltazar da Silveira uma sesmaria, e nela iniciou-se as atividades agropecuárias.

    Em 1726, a boa qualidade das terras e a previsível exaustão das catas e garimpos, levaram Manoel de Sá, também, a obter da Coroa Portuguesa uma sesmaria de meia-légua.
A região do Vale do Médio Paraíba é notada a partir da presença de Garcia Rodrigues Paes Leme, um dos primeiros bandeirantes a se fixar aqui região, por volta de 1715, quando obteve de D. João V a doação da terra. Terras essas habitadas pelos índios Puris.        Em 1744 Simão da Cunha Gago, bandeirante paulista, conseguiu do Governador Luís de Mascarenhas, licença para formar uma expedição que abriu caminhos pela mata virgem, chegando numa planície rodeada de montes, local que batizou de Campo Alegre da Paraíba Nova. A escolha do local deveu-se a fortes motivos de ordem econômica e geográfica, que influenciariam o desenvolvimento da região. Zona de amplo horizonte, num local bem servido de água pelos afluentes do Paraíba, colocada estrategicamente a meio caminho das rotas que se cruzavam em demanda do Rio, São Paulo e Minas Gerais, no período de extração aurífera.
O povoado que aos poucos se formou ficou conhecido como Campo Alegre da Paraíba Nova, transformando-se três anos depois em Nossa Senhora da Conceição do Campo Alegre da Paraíba Nova. Em 29 de setembro de 1801 passou a ser município alterando, inclusive seu nome para Resende em homenagem ao Conde de Resende. Sua titulação para cidade ocorreu em 1848, já devido a sua grande importância econômica dentro do Vale do Médio Paraíba eqüidistante dos principais centros econômicos do país Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo.
Fig. 1 Imagem Pioneira de N.S.da Conceição Trazida na Expedição de Simão da Cunha Gago.

Nestes campos encontramos o velho caminho dos Bandeirantes, que deu origem a cidades e vilas como Baependi, Bocaina de Minas e Aiuruoca. É de Aiuruoca que segundo narra Monsenhor Pizzaro de Araújo[9] que, o Coronel Simão da Cunha Gago mudou sua residência de São Paulo de Piratininga para o sítio da Lagoa de Ayruoca, na província de Minas Gerais.  Aí se ajustou com outros povoadores do sertão de sua vizinhança, para pesquisar ouro e diamantes, descendo em 1744 a Mantiqueira, logo avistando uma campina extensa e aprazível ali estabeleceram seus domicílios, tendo em sua companhia o Padre Filipe Teixeira Pinto. Em 12 de maio de 1747 obtiveram provisão para o uso de altar portátil, sob o amparo de Nossa Senhora da Conceição do Campo Alegre. E por Alvará Régio de 2 de janeiro de 1757 a Capela curada foi elevada a Matriz, com párocos próprios, tendo assim predicado de freguesia.  O Vice-rei de então, Conde de Resende Dom José Luiz de Castro, expediu uma provisão ao Ouvidor José Albano Fragoso, para que lhe desse imediata execução, indo ao distrito de Campo Alegre em companhia do guarda-mor Geral Fernando Dias Paes Leme da Câmara, e ali fundasse uma vila. E assim o Ouvidor fez cumprir a ordem do Vice-rei, no dia 29 de setembro de 1801, fazendo eleger vereadores, juizes e tabeliães, almotacés e escrivões, estabeleceu os limites do território da Vila, e estando presente a nobreza e o povo deu-se por criada e instalada a Vila de Resende.[10]

Simão Cunha Gago é o primeiro a ver a bacia terciária de Resende, encaixada no vale arqueano do rio, a qual, por seus peculiares fatores geológicos apresenta um solo menos fértil para o adensamento florestal, desdobrando cerrados ou longos campos descobertos; origem do nome do arraial edificado pelo coronel Cunha Gago.  Arraial este que é responsável pela abertura de um novo caminho das Minas Gerais para o Rio de Janeiro, logo proibido por ordem régia.[11]
Vimos então que desde a sua fundação como Arraial de Nossa Senhora do Campo Alegre da Paraíba Nova nos idos de 1744, Resende teve e tem papel preponderante na história da região do Vale do Paraíba uma vez que sempre esteve a partir de sua fundação nas rotas de abastecimento e apoio das caravanas que se deslocavam no seu ir e vir da costa aos sertões fazendo-se de extrema importância estratégica dentro da logística não só do período bandeirista dos séculos XVII e XVIII quando das empreitadas sertão adentro em busca de índios e, sobretudo na procura de mananciais auríferos da Minas Gerais. Por fim, dizemos que tudo se encaixa na saga do desbravamento dos sertões na procura de uma passagem através dos contra fortes da Mantiqueira, onde nessa dinâmica vemos a importância dos desbravadores como Simão da Cunha Gago para sociedade que temos hoje e para todas as cidades fronteiriças dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais que acabam partilhando uma História comum.

Bibliografia

Bopp, Itamar.  Casamentos na Matriz de Resende.  Instituto Genealógico Brasileiro, 1971.
____________. Notas Genealógicas.  São Paulo, Gráfica Sangirardi [S. D.]1987.

Leme, Luiz Gonzaga da Silva. Genealogia Paulistana, C. Gagos (Volume V - Pág. 03 a 213) http://www.geocities.com/lscamargo/gp/genpaulistana.htm2/7/2007 11:28


Maia, João de Azevedo Carneiro. do Descobrimento do Campo Alegre À Criação da Vila de Resende. [ S.Ed] , 1886.

________. Notícias Históricas e Estatísticas do Município de Resende desde a sua fundação . Rio de Janeiro, 1891 .

Pizarro, José de Sousa Azevedo.  Memórias Históricas da Província do Rio de Janeiro , 1820.

Paranhos,Paulo. Prineiros Núcleos Populacionais no Sul de Minas Gerais www.historica.arquivoestado.sp.gov.br/materias/anteriores/edicao07/materia03/texto03.pdf -2/7/2007 10:14

Rosa, Claudionor; org., Dilma Ferreira Miranda, Eny Marinho Mattos, Lourdes Maria Almeida, Rosa Maria Rodrigues Muniz Costa – Paróquia de N. Senhora da Conceição: uma história de fé. RTN Editora Patronato. 2005 Resende-RJ

Saint- Hilaire, Auguste de. Viagem À Província de São Paulo. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1976.

_______ .Viagem Pelas Províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1978. (Início Do Século XIX).

_______ 1822. Segunda Viagem do Rio de Janeiro A Minas Gerais e a São Paulo. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp


Sodré, Alfredo.  Resende, Os Cem Anos da Cidade.  [S.Ed]

Whately,Maria Celina, O Café em Resende no Século XIX, Ed.José Olympio, Rj, 1987.
______________, Resende, A Cultura Pioneira do Café no Vale do Paraíba, Niterói-RJ :Ed Gráfica La Salle , 2003.
______________, &  Maria Cristina  F.M. Godoy –ARDHIS –Academia Resendense de História.Resende, Crônicas dos Duzentos Anos, Resende-RJ :Ed Gráfica La Salle 2001




[1] Mestre em História Social, Economista, Professor de História Econômica, Formação Econômica do Brasil de Desenvolvimento Econômico e Social, Professor do Centro Universitário Geraldo Di Biasi Volta Redonda e Barra do Piraí; Membro da Academia Resendense de História , da  Academia de História Militar Terrestre do Brasil e Vice-Presidente do Instituto de Estudos Valeparaibanos- IEV -Lorena-SP.
[2]LEME, Luiz Gonzaga da Silva. Genealogia Paulistana  V. 2.º pág 123
[3] Paranhos,Paulo. Primeiros Núcleos Populacionais no Sul de Minas Gerais www.historica.arquivoestado.sp.gov.br/materias/anteriores/edicao07/materia03/texto03.pdf -2/7/2007 10:14
[4] Códice Costa Matoso. Coleção das notícias dos primeiros descobrimentos das minas da América que fez  o Doutor  Caetano da Costa Matoso sendo Ouvidor –Geral  das de Ouro Preto, de que tomou posse em fevereiro de 1749& vários papéis.Belo Horizonte : Fundação João Pinheiro.1999,p.183.
[5] Id.,p.183.
[6] Ibid, p.184.
[7] É impotante saber que estudos da genealogia Paulista nos mostra que Simão da Cunha Gago nasceu  em Mogi das Cruzes, antiga Vila de Sant’Anna de Mogy Mirim, importante ponto de parada para os exploradores dos Sertões em ir e vir a São Paulo de Piratininga.
[8] Etimologia: casa de papagaio
[9] Pizarro, José de Sousa Azevedo.  Memórias Históricas da Província do Rio de Janeiro, 1820.Taunay dá a chegada de Cunha Gago e expedição ao Campo Alegre por volta de 1740 oriundo de Aiuruoca – Hist.do café no Brasil,vol.II,p.141.

[10] Pizzaro e Araújo, Jose de Sousa Azevedo: Memórias Históricas do Rio de Janeiro. Rio,1820.
[11] “A ordem de 9 de abril de 1745 proibiu de usar-se do caminho que , das minas se Aiuruoca abriram Antonio Gonçalves de Carvalho e outros sócios para o Rio de Janeiro e costas do mar." Pizzaro  : Memórias Históricas do Rio de Janeiro. Rio,1820. Maneira encontrada pelo governo colonial para coibir o desvio e o contrabando do ouro das Minas Gerais.p.38

Um comentário:

  1. Sou descendente de Fellipa Gago, acho que é gente ligada a fundação de Campo Alegra da Paraíba Nova.

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