Julio Cesar Fidelis Soares[i]
Começaremos contar esta
história a partir do ambiente que levou a abdicação de Dom Pedro I nos anos
finais da década de vinte do século XIX entrando a crise pelos primeiros anos
da década de trinta. A estrutura construída na Independência fez com que fosse
organizado um sistema político que colocava os municípios dependentes das
províncias e estas, ao poder central; e ainda "adotaram um sistema de
eleições indiretas baseado no voto qualificado (censitário), excluindo a maior
parte da população do processo eleitoral. Disputaram avidamente títulos de
nobreza e monopolizaram posições na Câmara, no Senado, no Conselho de Estado e
nos Ministérios"[1].
Documento com pedido de Abdicação de Dom Pedro I.
Ou seja, o clima político era extremamente instável, mas é dentro deste
contexto que segundo Dr. João Maia em 4 de abril 1829 a Câmara Municipal de
Resende que era presidida pelo padre Joaquim Pereira Escobar e composta pelos
vereadores: Bento de Azevedo Maia, Padre José Marques da Mota, Padre Francisco
do Carmo Fróes , João Lourenço Dias Guimarães, Antonio Luis Gonçalves e
Comendador Fabiano Pereira Barreto. Nos primeiros dias de 1830 a câmara resolve
em uma de suas sessões, apreciar a proposta, apresentada pelo Padre Fróes, para
que se abrisse uma lista de subscrição popular com o objetivo de se construir
uma casa de caridade para tratamento de enfermos indigentes, situação que
demandou ser criada uma comissão parlamentar em 25 de janeiro de 1830.
Passado o tempo, ficou-se
em pauta a questão de instalação do pio estabelecimento, por compra, aluguel ou
construção do prédio, não podendo eles naquela ocasião por falta de meios fazer
construção de uma sede para o Hospital. Fato é que segundo Maia em 1832 houve a
instalação num casebre a rua chamada de Rua de Baixo, hoje Rua Simão da Cunha a
instalação do modesto hospital que tinha como figura importante o senhor
Gregório Rodrigues de Siqueira na função de tesoureiro e procurador e do
primeiro diretor nomeado o Capitão Antonio Pereira Leite[2].
Já há 25 de julho de 1835,
sob a proposta do Padre Joaquim Pereira Escobar, este indicou e a câmara
deliberou que fosse convidado o Padre Manoel dos Anjos Barros Carvalho,
residente na Vila de São Miguel das Areias (Hoje Areias-SP), lugar este onde
havia fundado e organizado uma Santa Casa de Misericórdia, para que viesse à
Vila de Resende auxiliar a Câmara da Vila a erigir um estabelecimento congênere
sabedores da destreza deste sacerdote na organização de obras pias, de modo que
ficou a cargo deste escrever os regulamentos e os princípios básicos da
irmandade.
Assim uma casa foi
alugada ao Senhor Antonio Gomes de Oliveira a Rua do Lavapés, que acabou sendo
chamada de Rua da Misericórdia. Neste
local se deu a inauguração solene da instituição com toda pompa e cerimônias
cabíveis. Em 2 de Outubro de 1835 criou-se a Irmandade da Santa Casa da
Misericórdia.
Em nossas pesquisas e
sempre corroborando com que está na obra de João Maia é que afirmamos que de
fato e direito o fundador da Santa Casa
de Misericórdia de Resende foi o Padre Manoel dos Anjos Barros de Carvalho,
conforme consta no livro de beneméritos que diz o seguinte: “Manoel dos Anjos
Barros de Carvalho considerado Benfeitor por ter sido o fundador da Santa Casa
em 25 de Julho de 1835.”
Fig.1 Registro dos Benfeitores onde consta o
crédito de fundador ao Padre Manoel dos Anjos Barros de Carvalho.
Sobre ele as únicas
coisas que sabemos é o que nos fala João Maia, que era oriundo e natural de São
João Del Rey na província de Minas Gerais, que era negro, mas livre de
nascimento, criado e mandado instrui-se por conta de um velho padre. Ao se
ordenar foi designado para Vila de Areias, ficando lá por um tempo e depois
vindo para Vila de Resende a convite do Padre Joaquim Escobar para criação da
Santa Casa. Ainda segundo Maia, consta era extremamente pobre, mal trajado,
quase descalço, sua abnegação era tão grande que dividia tudo que arrecadava
nas missas com os mais necessitados.[3]
Maia nos dá ainda notícias que Padre Manoel dos Anjos Barros de Carvalho teria
vivido na Vila de Queluz, província de São Paulo, se ainda segundo ele existe
ou existia uma imagem de São Benedito feita por ele.
No fim da vida, foi
designado para paróquia de Santo Antonio da Vargem Grande, onde ficou por algum
tempo, vindo a falecer entre os anos de 1840 ou 1841, com cerca de setenta anos
de idade, sem termos notícia do local de seu sepultamento.
Fig.2 Assinatura em rodapé do fundador ao Padre
Manoel dos Anjos Barros de Carvalho na ata de criação da Santa Casa.
Quanto a Provedoria já da
pia instituição o primeiro provedor registrado foi o Padre José Marques da
Motta, que veio para Resende em 1826 oriundo de São João Del Rey, presidiu a
Câmara Municipal em 1829, e foi o idealizador da criação do Projeto Província de
Resende. Em 1831 funda o primeiro jornal de Resende e terceiro da Província do
Rio de Janeiro – que se denominou O Gênio Brasileiro de 1831.
Fig.3 Registro da assinatura do Padre José Marques
de Motta primeiro provedor no Livro de Ata de Fundação da Santa Casa.
Em 25 de março de 1830
Padre Marques da Motta e o Capitão Eleutério da Silva Prado, membro da família
Prado de São Paulo, ao terminar uma seção solene do aniversário do juramento da
Constituição; Pe. Marques convida o ilustre visitante para ver o
recém-inaugurado quadro da figura do Imperador o que faz da seguinte maneira:
“Queres ver o retrato de um mono?” o que obteve de resposta do visitante – “Não
vejo bem esse macaco de fardão, chega-lhe a luz mais perto.” Segundo João Maia,
é neste momento que impeliu a mão do padre fazer arder o quadro da imagem de Sua Majestade Imperial.
E em 1º de Julho de 1830 é mandado abrir um inquérito por Crime de
Lesa-Majestade com punição de pena de morte. Padre Marques da Motta ficou
fugido por algum tempo mais voltou logo que soube da abdicação de Dom Pedro I
seu desafeto.
Fig.4 Imagem
do registro do livro de Benfeitores com a citação dos méritos do Padre José
Marques da Motta.
Assim vemos que a brava e
benemerente Santa Casa de Misericórdia de Resende é fruto de uma sociedade
conservadora, mas ao mesmo tempo liberal sabedora de seus compromissos não só
materiais terrenos no atendimento aos próximos, mas na importância de acolher
na caridade os mais carentes num momento de desprovimento da saúde. Ela
representava a junção harmônica das diferenças sociais tão marcantes e
prementes do século XIX, uma sociedade em transformação ávida para por os pés
na modernidade da Revolução Industrial, mas basicamente rural na essência,
levando a uma disputa entre liberais e conservadores, mas que na hora de
construir um bem público de valor como este Pio estabelecimento tornavam-se
irmãos na misericórdia e caridade sob o comando destes fantásticos padres que
sempre vislumbraram dias melhores mesmo eles não estando presentes neste
futuro.
Curiosidades Históricas:
I- Trecho da Ata de criação da Santa Casa de Misericórdia de Resende com aprovo do Regente Padre Diogo Antonio Feijó.
II- O Regente Feijó.
III- Num dos documentos Históricos da Santa Casa de Resende a Assinatura do Imperador D.Pedro II.
IV-Padre Jose Marques da Motta primeiro Provedor da Santa Casa de Misericórdia de Resende.
Antiga Rua da Misericórdia que era o caminha para se chegar a Santa Casa.
Vista da Cidade de Resende onde se destaca o Prédio da Santa Casa e a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição.
Frontão da a Santa Casa voltado para Rua de Misericórdia.
Bibliografia:
Fontes Primárias:
Arquivo da Provedoria da Santa Casa de Resende:
Documentos da Santa Casa de Misericórdia de Rezende – livro de 1835 a 1893
Ata de Criação da Santa Casa de Resende - 1835
Arquivo Histórico Municipal – Resende, RJ.
a) Atos da Câmara, correspondência dos Presidentes,
Vice-Presidentes e Secretários. Símbolo
CMI,1 2.ªcaixa-Correspondência dos Presidentes, Vice-Presidentes e Secretários.
1831-34; 1836-37; 1840;
Vereadores -
Documentação produzida e recebida pelos Vereadores e relativa às suas funções:
ofícios, indicações, propostas, pareceres das Comissões. Símbolo CM1
1.a caixa - 1824;
1826-35.
2.a caixa - 1836-41;
b) Livro de Ata Câmara Municipal de Resende – CM 1829 à
1833 registro da Seção ordinária de 7 de
Julho de 1829 – página 27 e 27 Verso.
c) Livro de Ata Câmara Municipal de Resende – CM 1829 à
1833 registro da Seção Extraordinária de
4 de Agosto de 1829.
Barcellos, Marcos C., A Santa Casa da Misericórdia de
Resende– Religiosidade e Política na Paraíba Nova (1801-1848),Artigo –
Universidade Federal de Dourados - Dourados, MS, v. 12, n. 21, jan./jun. 2010 acessado in:
http://www.periodicos.ufgd.edu.br/index.php/FRONTEIRAS/article/view/597
Bento,Claudio Moreira, A Saga da Santa Casa de Misericórdia
de Resende 1835 a 1992 , ed.Senai- 1992.
Bopp, Itamar.
Casamentos na Matriz de Resende.
Instituto Genealógico Brasileiro, 1971.
____________. Notas Genealógicas. São Paulo, Gráfica Sangirardi [S. D.].
Junior, Caio Prado, Evolução política do Brasil: colônia e
imperio,Editora Brasiliense SP, 1994.
Maia, João de Azevedo Carneiro, Notícias Históricas e
Estatísticas do Município de Resende desde a sua Fundação . Rio de Janeiro,
1891.
Soares, Julio Cesar F., A Província de Resende 1829, artigo
publicado
http://www.valedoparaiba3.com/nossagente/estudos/a_provincia_resende.pdf
Sodré, Alfredo.
Resende, Os Cem Anos da Cidade.
[S.Ed]
Whately,Maria Celina, O Café em Resende no Século XIX,
Ed.José Olympio, Rj, 1987.
__________, Resende, A Cultura Pioneira do Café no Vale do
Paraíba, Niterói-RJ :Ed Gráfica La Salle , 2003.
__________, &
Maria Cristina F.M. Godoy –ARDHIS
–Academia Resendense de História.Resende, Cronicas dos Duzentos Anos,
Resende-RJ :Ed Gráfica La Salle , 2001.
[1] Junior, Caio Prado, Evolução política do Brasil: colônia e
império,Editora Brasiliense SP, 1994 pág. 62
[2]
JOÃO PEREIRA LEITE, n. e bat. na freg. de Pouzo
Alto, morador nesta Vila desde 1798, com 22 anos, f. l. de Alferes João Leite
da Silva, este o 1.o Tesoureiro eleito pela CM., por ato de 30-IX-1801, quando
da criação da vila de Resende em 29-IX-1801. Grande fazendeiro de café, como
consta na Escritura Pública de 07-V-1802, vendendo terras e cafezais no
Ribeirão Razo, recebidas por títulos de Sesmarias e de sua mulher Ana Pereira
de Mello (na residência deste casal, tomaram posse os primeiros Juizes,
Vereadores e Oficiais, perante o Ouvidor José Albano Fragozo e na presença do
Juiz Presidente André Bernardes Rangel) esta, f.l. de Gaspar Alves de Mello e
de s/m. Ângela Pereira de Mello, e o Alferes, f. l. de Jerônimo Leite
Guimarães, n. Portugal que declarou em 1774 contar 52 anos, e s/m. Luiza
Rodrigues do Prado, filha de Vicente Gonçalves Preto e de Felippa do Prado ou
Fellipa Gago, casal este que morava em São José (Hoje Tiradentes, MG.) cerca de
1730 e morava em Sant'Ana do Capivarí (Capela filial de Pouzo Alto) no ano de
1752. Reg.333 http://www.genealogiafreire.com.br/bopp/casamento_300_500.htm
[3]
Maia,
João de Azevedo Carneiro. do Descobrimento Do Campo Alegre À Criação Da Vila De
Resende. [ S.Ed] , 1886. P.125
[i]
Mestre em História Social, Economista e Professor Universitário – Membro da Academia Resendense de
História(Resende-RJ),Academia de História Militar Terrestre do Brasil,
Instituto de Estudos Valeparaibano (Lorena-SP) e Professor do Centro
Universitário Geraldo Di Biasi – Volta Redonda-RJ.
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