Palavras-Chave:
Café - ferrovia - economia - sociedade
O
Brasil no século XIX era um grande produtor de produtos primários que acabavam
indo parar na Inglaterra para negociar com resto do mundo. Assim era necessária a construção da Estrada
de Ferro D. Pedro II(1858), pois o país necessitava dar escoamento à produção
dos produtos agrícolas destinados à exportação e ao abastecimento interno das
Províncias do Rio de Janeiro,São Paul e Minas Gerais. A idéia precursora remonta ao dia 1º de julho de 1839, quando o
médico Thomaz Cochrane requereu a Assembleia Brasileira o privilégio exclusivo
para organizar uma companhia que construísse uma linha férrea cujo traçado,
começando na Pavuna e subindo a Serra do Mar, chegasse até Vila de Resende,
acompanhando a margem do rio Paraíba. Mesmo tendo conseguido, em 1840, a
concessão, Cochrane teve seu contrato rescindido, pois segundo historiadores
solicitou adiantamentos de recursos e o projeto não teve andamento.
Somente
após 15 anos a Companhia Estrada de Ferro D. Pedro II, feita aprovação de seus
Estatutos ficou constituída a Companhia Estrada de Ferro D. Pedro II . Em
agosto do mesmo ano, sob a direção do engenheiro Christhiano Benedicto Ottoni,
foram iniciados os trabalhos de construção. O projeto previa uma via férrea que
atravessasse alguns municípios próximos à Capital, seguisse pelo Vale do
Paraíba e, daí as Províncias de São Paulo e de Minas Gerais através dos ramais.
Foi inaugurada em 29 de março de 1858, com trecho inicial de 47,21 km, da
Estação da Côrte a Queimados, no Rio de Janeiro. Esta ferrovia se constituiu em
uma das mais importantes obras da engenharia ferroviária do País, na
ultrapassagem dos 412 metros de altura da Serra do Mar, com a realização de
colossais cortes, aterros e perfurações de túneis, entre os quais, o Túnel
Grande com 2.236 m de extensão, na época, o maior do Brasil, aberto em 1864.
Vencidos
os maciços rochosos da Serra do Mar, a linha se bifurcou. O ramal chamado Linha
do Centro seguiu em direção a Entre Rios (atual Três Rios). O ramal denominado
Ramal de São Paulo, seguiu em direção ao Porto de Cachoeira (atual Cachoeira Paulista),
atingindo-o em 20 de julho de 1875.
fig.1- Estação de Cachoeira Paulista Ramal São Paulo ponto de encontro da ligação ramal paulista e do Rio de Janeiro. Collecção de 44 vistas photographicas da Estrada de Ferro D. Pedro 2.. [foto 39] século XIX.
O primeiro trem de passageiros chega a Barra
do Piraí a 9 de agosto de 1864 logo depois chega a ferrovia à Barra Mansa pertinho de Resende.
Fig.2 Estação de Barra do Pirahy linha Central importante centro de entroncamento ferroviário.Acervo Biblioteca Nacional.
Fig.3 Estação da Estrada de Ferro D.Pedro II em Barra Mansa. Acervo Biblioteca Nacional.
A ferrovia trás furor, é o progresso, assim segundo Whately(1987) o engenheiro Ottoni ,diretor da estrada de ferro publica no Jornal do Commercio uma circular solicitando aos fazendeiros uma subscrição pública para terminar a 4ª seção e dizia:
Fig.2 Estação de Barra do Pirahy linha Central importante centro de entroncamento ferroviário.Acervo Biblioteca Nacional.
Fig.3 Estação da Estrada de Ferro D.Pedro II em Barra Mansa. Acervo Biblioteca Nacional.
A ferrovia trás furor, é o progresso, assim segundo Whately(1987) o engenheiro Ottoni ,diretor da estrada de ferro publica no Jornal do Commercio uma circular solicitando aos fazendeiros uma subscrição pública para terminar a 4ª seção e dizia:
“Não podendo o governo do nosso
país já e já prolongar a 3ª e 4ª secções
da Estrada de Ferro Pedro II ,nem convindo suspender a continuação dos
trabalhos pela perda do serviço já organizado,e que demorará talvez muitos anos
a realização de um benefício vivamente reclamada pela rica lavoura desta e das
províncias de Minas e São Paulo, resolvi fazer
a declaração impressa no Jornal do Commercio de 1º do corrente , na qual
aponto os meios práticos de levar ao cabo obra de tamanha importância e para a
qual chamo toda atenção de V.S. . A principal dificuldade consiste no
alevantamento de capitais preciosos para a conclusão das obras e para este fim invoco
diretamente a coadjuvação valiosa de V.S. na convicção de que se prestará a
promover a reunião de pessoas de seu município e paróquias que se encarreguem
de distribuir o maior numero possível de ações, de modo a poder juntar-se o
capital indispensável. Nesta Corte, achar-me-á V.S. sempre pronto a receber
suas ordens e disposto a empregar toda energia em facilitar os meios de levar
ao fim a 3ª e 4ª secções de Estrada de Ferro Dom Pedro II,como muito convém à
nossa Pátria e especialmente a este município . Sou com estima e consideração.” C.B.Ottoni[1]
Tal
chamamento não ficou sem resposta em Resende reunia a Comissão Municipal de
Resende, compostas por notáveis como Dr. João Carneiro de Azevedo Maia,
Francisco de Sousa Ramos, Domingos Gomes Jardim, Coronel GN Fabiano Barreto e
Antonio Jose Dias Carneiro e se organizaram para gerenciar subscritores para
financiar a grande obra, ligar Resende a Corte.
Este
era um sonho que perambulava em algumas mentes resendenses desde o início do
projeto e ainda mais quando os trilhos
da ferrovia chega em 1864 a Barra do Piraí, destaca-se dentre todos a
figura do Alferes GN Joaquim Antunes,
amigo de Chisthiano Ottoni e compadre de Mariano Procópio, que era engenheiro
chefe do serviço de locação. O Alferes desdobra-se em ações, palestras, viagens
a Côrte, pois para ele a ferrovia é o progresso o futuro sobre trilho.
O
Alferes Antunes na certeza de que os trilhos da Ferrovia Dom Pedro II chegaria
e iria passar pelos Campos Elíseos, tratou de providenciar sob seu custo ao longo
do traçado da via férrea uma rua que solicitou à Câmara que desse o nome de seu
compadre Mariano Procópio e assim se fez. E faz mais doa 22 hectares de terra
para o município a fim de preparar a cidade para o progresso com a abertura de
novos logradouros próximo a passagem do trem.
E
o certo é que no dia 27 de Outubro de 1872 irrompe pelos trilhos a verdade, a
locomotiva denominada Exploradora que
atravessando o pontilhão do Surubi,cuja construção segundo Maia(1891) teve sua
obra iniciada em 1871 e que em ainda não estando totalmente pronta,a locomotiva
Exploradora teve que transpor pela
primeira vez o rio Paraíba através a serviço de lastros indo até o sítio dos
Portinhos e chega ao seu ponto final a
Gare de Rezende.
Fig.4
– Foto
de uma Máquina Baldwin típica da década de 70 do século XIX,é provável que as
que operavam na E.F. D.Pedro II fossem bem parecidas com esta imagem.
A
19 de fevereiro de 1873 com a obra toda pronta, passa pela ponte do Surubi a
Locomotiva Petrópolis[2],
não segue, pois a obra da ferrovia ainda estava em andamento quanto à ligação a
estação de Boa Vista, obra esta que teria seu final em 1874.
fig.5 - Ponte de Resende ramal de São Paulo Km 189,233 transpunha o Rio Paraíba do Sul, acervo fotográfico Biblioteca Nacional.http://objdigital.bn.br/.../icon381909/icon1151184.htm Fonte: Collecção de 44 vistas photographicas da Estrada de Ferro D. Pedro 2.. [foto 33]
Ainda em 1874 se fez necessária em função da intensidade do tráfego na ferrovia a criação de uma estação intermediária entre Resende e Boa Vista e aí se resolveu construir a estação de Campo Belo. Tal estação segundo Bopp deveria ser construída na altura da Fazenda Itatiaia de propriedade do Comendador Rocha Leão, pois este se ofereceu a doar as terras para construção da Gare.
Fig.6 Estação de Itatiaia - recebeu o nome de Barão Homem de Melo,ilustre morador de São José de Campo Bello.
Em função da freguesia de Sant’Anna dos Tocos ser grande centro de atividade econômica no campo da produção agrária com grande produção de café, fumo e outros cereais é que se achou por bem em maio de 1875 construir a estação de Nhangapi, região entre Campo Belo e Boa Vista, hoje respectivamente Itatiaia e Engenheiro Passos, nesta caminho houve a necessidade da construção da Ponte do Salto para se chegar a Boa Vista(hoje Engenheiro Passos).
Fig 7 - Ponte do Salto destino Estação de Boa Vista.Fonte Collecção de 44 vistas photographicas da Estrada de Ferro D. Pedro 2.. [foto 35] Biblioteca Nacional.
Fig.8 - Estação de Boa Vista hoje Engenheiro Passos - Resende -RJ
Nos
idos da década de 1870 segundo o Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial
Laemmert o município de Resende era importante e estava ávido a receber as
benesses do progresso pois tinha uma população de 25.000 habitantes divididos
por suas freguesias de Nossa Senhora da Conceição do Campo Alegre, São Jose do
Campo Bello, Senhor Bom Jesus do Ribeirão de Sant`Anna, Santo Antonio da Vargem
Grande e São Vicente Ferrer. O almanaque
ainda nos dá algumas características das terras resendenses :
“Sobre
um terreno notavelmente accidentado, cujo solo em sua maxima parte se pode
chamar argilo-ferruginoso, o município de Rezende produz o melhor café ,
excellente canna de assuçar, cereaes e legumes de toda espécie. Nas planuras do Itatiaya abundão as pastagens
nativas, offerecendo assim recurso naturaes para a criação de toda espécie de
gado; algumas fructas da Europa como maçã , o marmelo [...] .”[3]
É importante destacarmos também que em outro
trecho do mesmo almanaque ele nos traz notícia do plantio de parreiras cuja
produção de uvas era abundante, e que houve algumas tentativas de produção de
vinho, que se assemelhava ao do Rheno só que muito mais aromático segundo os
editores do almanaque.
Do
núcleo urbano, a Freguesia de Nossa Senhora da Conceição, esta era vista em
destaque por suas três colinas, cada uma com o seu templo a Matriz, Rosário e
Senhor dos Passos. À margem esquerda do Rio Paraíba do Sul e em frente ao
núcleo urbano encontra-se o bairro de Campos Elíseos que se ligava à cidade por
uma ponte de madeira, neste bairro estava também localizada a estação da linha
de Ferro D. Pedro II que ligava o município à corte. Nesse período estimava-se que o número de habitantes
da freguesia da “Cidade” era de 2.400 habitantes, que residiam numas 430 casas,
construídas sem muita opulência. O
interessante é que ao estudarmos estes relatos vimos que muitas casas eram
remanescentes do período inicial da constituição da Vila de N. S. da Conceição
do Campo Alegre, pois nos foi relatadas da seguinte forma pelo autor do
almanaque “[...] bem pouco sólidas, pelo
uso ainda em voga dos antigos e condemnados baldrames de madeira[...]”[4]. Os edifícios que mais se destacavam eram a
Matriz de N. S. da Conceição, o edifício da Câmara e Cadeia e a Santa Casa da
Misericórdia localizada no bairro do Lavapés, o mais antigo bairro da cidade.
Mas
na Resende nos idos da década 70 do século XIX nem tudo eram alegrias pela
chegada da ferrovia as navegações foi uma vítima. Achamos no editorial do
jornal Astro Rezendense[5]
afirmando que era uma realidade a chegada da ferrovia, mesmo porque já se tinha
a autorização para se programar um braço da Estrada Dom Pedro II, a Estrada de
Ferro de Rezende a Arêas(ou Rezende-Bocaina). E alertava o editorial que a
atividade de navegação fluvial empregava trezentos braços e alimentava mil e
quinhentos indivíduos e a partir do aparecimento das ferrovias tal atividade
estava desaparecendo o que causou um grande golpe nos trabalhadores que o
editor chamou de “população fluctuante”.
Em outro aspecto o editorial vai mais longe dizendo que Resende era um centro
de parada e transito das pessoas que iam e viam da corte para interior e vice
versa e que ao findar esta atividade que era complementar na estrutura de transportes
fez cessar completamente tal atividade gerando um golpe que o autor classifica
como “mortal” para economia da região, gerando do ponto de vista imobiliário
queda de aluguel e desvalorização dos imóveis.
Fig.9- Imagem da Estação de Resende Km 190 do Ramal São Paulo da Estrada de Ferro Dom Pedro II. Acervo Digital Biblioteca Nacional.
Dentre
os reclames sobre a chegada da ferrovia existe um que publicado em Outubro de
1872 demonstra bem como realmente afetou a economia local. O Major da Guarda
Nacional João Baptista Brasiel diz em editorial:
“
É incontestavelmente uma grande alavanca de progresso a communicação dos
centros de producção para o litoral por
via férrea;é também uma verdade incontestável que a estrada de ferro de D.
Pedro II não tenha trazido ao paiz o beneficio que a lavoura e o commercio tem
o direito de esperar de um melhoramento dessa ordem. Três são as principais questões econômicas
que devem ser resolvidas favoravelmente pelo transporte por uma via férrea : 1ª diminuição do preço do frete; 2ª brevidade
no transporte; 3ª bom acondicionamento nos gêneros para não soffrerem avarias
ou qualquer deterioramento em suas qualidades.
Teremos conseguido todos estes melhoramentos ou ao menos alguns delles
com a via férrea D. Pedro II? (sic)
Fig.10 - Jornal O Astro Resendense 18772 -Fonte:
Arquivo Histórico Municipal –Resende-RJ
De
outro modo vemos como a ferrovia ajudou a melhorar o transporte da maior riqueza
da região, o café, e isto é o que nos diz
a Ata da Câmara Municipal de Resende datada do mês de setembro de 1875.
“Considerando um
terço desta exportação pertencente à Província de São Paulo,segue –se que
Resende concorria com 2.727.502 Kg . De 1º de janeiro a 30 de setembro último a exportação foi de
2.299.640 Kg , faltando ainda o quarto e o último trimestre com o qual se
elevará sem dúvida a 3.000.000 Kg . Atendendo,pois,à área cultivada , ao
pessoal empregado na lavoura e à
exportação conhecida,pensa a Comissão que a exportação anual do município deve
ser de 8.600.000 Kg pelo menos, sendo toda ela para o mercado da Côrte.”[6]
Não há duvidas que a ferrovia trouxe
com todo seu aparato uma nova dinâmica econômica,social e cultural para esta
região que por muito tempo foi chamada dos sertões de serra acima lugar ermo de
sociedade conservadora tradicional avessa ao progresso que veio através do trem
de ferro monumento inquebrável da nova economia que queria mais e mais, que não
perde tempo na lentidão bucólica das cargas em lombo de tropas, no romântico
transporte fluvial que marcou toda uma época. Agora devemos entender que o café
e seus elementos do progresso não deu ao Vale do Paraíba o desenvolvimento
econômico, trouxe sim o crescimento econômico enquanto durou os cafezais,
entretanto, a ferrovia legado da produção fez a integração de Resende aos
grandes centros bem como com todo o Vale do Paraíba.
Julio
Cesar Fidelis Soares[1]
[1] Professor Mestre em História Social, Economista, membro
do IEV-Lorena-SP, da Academia Resendense de História e da Academia de História
Militar Terrestre do Brasil. Professor do Centro Universitário Geraldo Di Biasi
– Volta Redonda.RJ
Referências Bibliográficas:
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Público de Resende, Fundação Casa de Cultura Macedo Miranda, acervo
documentação da Câmara Municipal de Resende.
Jornal
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Government Document Digitization Project. Disponível em:
<www.crl.edu/content/almanak2.htm>.
http://brasil--historia.blogspot.com/2009/11/estrada-de-ferro-dom-pedro-ii-1858.html acessado em 11/03/2012
http://www1.dnit.gov.br/ferrovias/historico.asp acessado em 10/03/2012
http://www.estacoesferroviarias.com.br/efcb_rj_ramalsp/engpassos.htm
acessado em 12/03/2012
http://www.aglimpse.com/images/tr/tr419.jpg BALDWIN LOCOMOTIVE WORKS.
Ca. 1870's 5" x 8" albumen image on 7" x 10" mount. Printed
text of Baldwin Locomotive Works, Burnham, Parry, Williams & Co.
Philadelphia. Broadside view of the "Meteor" of the L.I.R.R. (Long
Island R.R.), along with its tender. Beautiful view, slight edge chipping at
corners. (Tr.419)acessado em 25/03/12.
[1] Jornal do Commercio 2 de Setembro de
1866, reproduzida pelo Astro Rezendense.
[2] Neste
ponto existem discrepâncias pois segundo
o Cel. Alfredo Sodré: “o certo é que em fevereiro de 1873, a primeira
locomotiva a Princesa Imperial –
alcançava, silvando estrepitosamente, a estação de Resende, em Campos
Elíseos”.In : Resende, os cem anos da
cidade. Jornalista, Maçon,Coronel da Guarda Nacional, foi editor do jornal
“O Tymburibá”, redator do jornal “A Lira”, primeiro prefeito eleito de Resende
em 1922,Tabelião do 1º oficio de notas e
Provedor da Santa Casa de
Misericórdia.Condecorado pelo Grão Mestre Geral da Ordem com Medalha de
Ouro de Benemérito da Ordem.(é1865U1955).
[3] Almanak
Laemmert, edição 1874, Município de Rezende, p.125.
[4]
Idem, Almanak Laemmert, edição 1874, Município de Rezende.
[5]
Jornal Astro Resendense de 15 de junho de 1873 ed.Nº.4 Anno VIII - Arquivo
Histórico Municipal.
[6]
Coleção Atas da Câmara Municipal de Resende- ano 1875- Arquivo Histórico
Municipal.