Por Julio Cesar Fidelis Soares - ARDHIS
Claudionor Rosa - ARDHIS
Resumo
Este artigo mostra a importância da economia agro-exportadora
cafeeira nos municípios de Resende e São José do Barreiro, que se beneficiando
da conjuntura favorável daquele momento, coloca
o café como centro dinâmico da economia, atraindo as forças
econômicas - capitais e mão-de-obra - e provocando mudanças em todos os outros
principais setores da sociedade,
conseguindo trazer a mais moderna tecnologia Ferroviária do século XIX. A
ferrovia, trabalha para a melhor distribuição da riqueza de suas regiões
operando mais uma vez mudanças na constituição das classes sociais, com o
declínio de umas e a ascensão de outras, trazendo saudade daqueles tempos.
Palavras-Chave:
Café - ferrovia - economia - sociedade
Este estudo se deu da nossa curiosidade em resgatar
mais um pouco da história dos transportes na Resende dos séculos passados e da
história do Vale do Médio Paraíba Fluminense em ligação com o Vale do Paraíba
Paulista. Através da obra de Maria Celina Whately é que nos orientamos sobre
informações das diversas etapas da história do transporte na região. Dentre estas
etapas destacou-se a ferrovia, que deu mobilidade não só às pessoas, às cargas,
mas acima de tudo dinamizou o comércio. O transporte em nossa região deu-se
então em três etapas: via terrestre, com transporte das tropas de mulas e
ferroviário, via marítima e fluvial. Nosso foco se dará mais precisamente no
transporte ferroviário, que a partir da década de 1870 chega a nossa região
mudando e dinamizando mais ainda o perfil econômico da região de Resende. Desde
o final do século XVIII já era um importante entreposto comercial e ponto de
convergência entre as tropas oriundas das Províncias de São Paulo e Minas
Gerais com destino ao mercado da Corte. Um dos fatos que corroboram com isto e
que mostra também a importância e as ligações sócio-econômicas entre Resende, Bananal,
São José do Barreiro e Areias, é a construção da estrada Resende-Ariró que
tinha como objetivo não só alçar o porto de Mambucaba, mas unir, consolidar e
facilitar o transporte e a mobilidade entre as populações desta região que eram
as maiores produtoras e exportadoras de café. Assim, tal empreitada foi
realizada sob o comando de Domingos Gomes Jardim[1]. Com o passar do tempo e o crescimento
econômico da região, nos idos de 1872, chega à Resende a Estrada de Ferro D. Pedro
II. Segundo o jornal O Astro Resendese,
as principais questões econômicas que trariam vantagens e favorecimentos à região
seriam: diminuição dos preços, a brevidade nos transporte e melhor
acondicionamento dos gêneros transportados.
Fig.1
– Carta relatório dando conta do andamento das obras da Estrada Resende-Ariró –
antigo caminho de transporte de Café.
Em 1874
a estrada de ferro chega a Boa Vista[1]
fazendo com que o trecho contasse com quatro estações: Resende, Campo Belo, Itatiaia
e Boa Vista. Com isto, as exportações de café de São José do Barreiro, Areias e
Bananal também eram atendidas.
A importância econômica desta região era tão grande
que em 21 de
fevereiro de 18 72 foi concedido por decreto número 4893 a autorização do
Governo Imperial para construção de uma ferrovia que partiria de Resende, na
província do Rio de Janeiro, indo em direção à província de São Paulo para
concorrer com incremento comercial e agrícola dos municípios de Bananal, São
José do Barreiro e Areias; e ainda com o objetivo de
contribuir com o transporte das produções de Cunha e Silveiras[2]. Constituindo assim, um
ramal da Estrada de Ferro D. Pedro II. O entroncamento se deu a 335 metros da ponte
sobre o Rio Paraíba, antes da estação do Campos Elíseos em Resende em terreno
que hoje se localiza o bairro do Surubi. Em 1876, no transcorrer das obras,
ocorre uma modificação do traçado, sendo estas alterações aprovadas por S. M. o
Imperador em 9 de fevereiro do mesmo ano. Assim, no dia 30 de novembro de 1877,
dá-se a inauguração provisória do trecho Resende-Estalo com o trem partindo da
plataforma do Surubi às 7 horas da manhã[3]. A
inauguração definitiva do percurso até a estação de Formoso acontece em 8 de janeiro de 18 78
e o término das obras levando até São José do Barreiro, em 19 de fevereiro de 18 92.
Fig.2 – Carta convite
da Companhia Estrada de Ferro Resende-Areias para inauguração do trecho
provisório.
Resende e sua Ferrovia
A rua
Dr. Clodomiro Maia, no Lavapés, é também conhecida por Rua do Trenzinho, porque
durante 52 anos foi parte do leito da extinta Estrada de Ferro Resende-Areias, também
chamada de Estrada de Ferro Resende-Bocaina. No início, propriedade da Casa Finnio
& Irmãos, do Rio de Janeiro, com vários acionistas e dentre o patrimônio
contava com as estações: Surubi, Plataforma (Santa Casa), Babilônia, Estalo e
Formoso. Ao longo da linha a Estrada de Ferro possuía bitola entre os trilhos
de aproximadamente um metro.
Depois a ferrovia foi ampliada com as estações Independência,
Riachuelo, Campinho e o ponto final em São José do Barreiro, totalizando 39 quilômetros , com
planos de, atravessando a cidade de Cunha (SP), chegar ao litoral, visando,
principalmente, o escoamento da produção cafeeira. Alcançar Cunha e o litoral
foram planos não concretizados.
“No dia 15 do corrente foi aberto
ao tráfego a E. F. Resende Areias, da estação do Suruby até a de Estalo. A
locomotiva Formosa, conduzindo três vagões de passageiros e um carro de
bagagens. Partiu do Suruby às 6:30h s
da manhã ao som da Banda de Música da Sociedade Santa Cecília. Às 6:45h s rodou o trem, chegando à
estação de Babilônia às 7:35h s,
onde o aguardava grande número de cavalheiros e damas do Alambari, Formoso e Barreiro. A banda
de música do sr. Barão de Bananal saudou a todos. Com a construção de outros
ramais já em fase de projetos, ficaremos em contato imediato com a parte do
Bananal, e grande zona do sul deste município, animadas todas pelas lavouras do
café...” [1]
Além
das residências dos funcionários e das oficinas instaladas no Surubi, a
ferrovia operava 3 locomotivas[2]
(marias-fumaças) movidas à lenha, 3 vagões para carga, 3 carros para
passageiros e 1 automotriz (automóvel de linha) movido à gasolina.
Fig. 3 – A locomotiva “Bocaina” uma
das três máquinas operadas pela ferrovia.
A Circulação de Mercadorias
Os
jornais da época nos dão conta do fluxo e movimento de economia da região, o
“Tymburibá” registra em uma de suas publicações o seguinte:
“Em
todas as estações da E. de Ferro Resende a Areias e D. Pedro II, vende-se
bilhetes e despacha-se encomendas, mercadorias, diretamente para quaisquer
estações das referidas estradas de ferro. São fornecidos sacos vazios para
transporte de café, pelo preço da tarifa.” [1]
O Declínio
Com o
decorrer dos anos, a ferrovia começou a apresentar problemas de custeio, a
reduzir, e até mesmo a suprimir viagens de trens de passageiros e de cargas.
Na
busca de solução para o trenzinho o Dr. Oliveira Botelho, entre outras
alternativas, propôs ao governo federal a aquisição da ferrovia, através da
Central do Brasil. Depois de muitas especulações a ferrovia foi comprada pela
Refinadora Paulista, com promessa de incentivar o plantio da cana para
alimentar a fabricação de açúcar, na usina de Porto Real, também de propriedade
do mesmo grupo. No entanto, a aquisição apenas adiou a questão. Em outubro de 1928 a Refinadora dispensou
todos os ferroviários, alguns com mais de trinta anos de serviço e, usando um
termo bem atual, começou o sucateamento da estrada e a transferência do
material para a cidade paulista de Piracicaba, onde a empresa tinha várias
usinas e pequenos trechos ferroviários.
A medida gerou uma crise
de desemprego até então sem precedentes na história de Resende, ocasionou o
fechamento de outras atividades que viviam em função daquele trem.
O Aceno derradeiro
“Faço
público que a Estrada de Ferro Resende a Bocaina, antiga Resende a Areias,
encerrará usas atividades, dia 16 próximo. Quem se julgar credor da Ferrrovia,
sob qualquer título, é solicitado a apresentar a devida conta no escritório da
companhia, à Estação Oliveira Botelho, para os devidos fins de direito.
Assinado o gerente Nelson Godoy”.[1]
(Jornais “A Lira” e “Opinião” – novembro de 1928)
Como
a canção famosa do Milton Nascimento, ao velho maquinista com seu boné só coube
a tarefa de acenar pela derradeira vez. A ferrovia foi paralisada e, desta vez,
para sempre.
[1]
Jornal “A Lira”, edição de Álvaro Silva foi um dos jornais do século XIX que
mais tempo circulou, terminando por volta do ano de 2001. “Opinião” – novembro
de 1928).
Fig.5 – Locomotiva Formosa, uma
das que operaram na ferrovia(1899).
Fig. 6 – Visita feita à região
pelo Presidente Hermes da Fonseca, onde
utilizou a ferrovia saindo da Estação do Surubi. A foto mostra a recepção ao presidente em São José do Barreiro –SP.
Fig.7 – Relatório do
ministério da Agricultura, Comércio e Obras públicas aprovando modificações no
trajeto da Estrada de Ferro Resende-Areias, que era um braço da E.F. Dom Pedro
II.
Bibliografia:
Almanaque Laemmert. 1845-1885
Jornais:
“ A Lira “ – 1928
“ Opinião” – 1928
“Tymburibá” -1882
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[1]
Jornal “Tymburibá” – novembro de 1882 – publicação de Henrique Fonseca e
Gustavo Amorim. 1881 até 1936.
[1]
Jornal “Itatiaya” – 17 de novembro de 1877, publicado por Jose Ribeiro dos
Santos Alves.
[2]
Estas Locomotivas receberam os seguintes nomes conforme a tradição ferroviária:
Resende, Bocaina e Formosa, talvez uma deferência a Formoso. Segundo Celina
Whately, a viagem durava 4 horas, se fazendo três dias por semana, com viagem
de ida e a volta no dia seguinte. (ver fig.3)
WHATELY,
Celina. Café em Resende no século XIX.
Rio de Janeiro: Jose Olympio, 1987. p.31.
[1]
Boa Vista é denominada hoje Engenheiro Passos em homenagem a Francisco Pereira
Passos, Engenheiro chefe da Construção da Ferrovia e responsável por trazer a
obra até o limite com a Província de São Paulo.
[2]
Relatório do Ministério dos Negócios e Agricultura à Assembléia Geral
Legislativa. ano 1874. p.128.
[3]
Conforme carta-convite expedida a Câmara Municipal de Resende assinada por
Oscar K. Ford gerente da companhia Estrada de Ferro Resende-Areias. Arquivo
Público Municipal - Resende-RJ (ver fig.2)
[1]
Gaúcho de Viamão, deu origem a uma das linhagens de família mais tradicional de
Resende, foi responsável pela administração e construção da estrada do Ariró
conforme atesta carta resposta expedida em 1831 dando conta dos progressos da
obra. (Ver fig.1)